Política

Dilemas da Humanidade: Industrializar para quem? Sul Global busca novo modelo de desenvolvimento

A industrialização voltou ao centro do debate – mas para quem, como e a serviço de quê?

Durante décadas, o Sul Global foi empurrado para as margens do desenvolvimento industrial. A divisão internacional do trabalho, forjada no colonialismo e aprofundada pelo neoliberalismo, especializou países periféricos na produção de bens primários, enquanto a vanguarda da tecnologia e da inovação se concentrava no Norte Global.

É nesse contexto que acontece o ciclo de debates Dilemas da Humanidade, organizado pelo Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e por diversas organizações populares e acadêmicas do Brasil e do mundo. Ao longo de cinco dias, o evento reúne vozes do Sul Global para discutir caminhos alternativos ao atual modelo de desenvolvimento, com foco em soberania, justiça social e transformação estrutural.

O painel “Política industrial para o desenvolvimento”, nesta quarta-feira (09), recoloca a industrialização como tema central para o futuro dos povos do Sul. E mais: escancara a disputa em torno de que tipo de industrialização se quer construir.

Esther Dweck, ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos do Brasil, apontou o renascimento das políticas industriais em todo o mundo – inclusive promovidas por governos de direita, como reconhece o próprio FMI. No Brasil, essa retomada ganha contornos próprios com o programa Nova Indústria Brasil (NIB), que aposta em investimentos públicos, transformação ecológica e reforma do Estado como motores de desenvolvimento. Para Dweck, a política industrial precisa caminhar junto com a reconstrução das políticas sociais e a reforma tributária, consolidando um novo ciclo de desenvolvimento nacional.

Lei-de-Diretrizes-Orcamentarias-2026O-Grande-ABC-1 Dilemas da Humanidade: Industrializar para quem? Sul Global busca novo modelo de desenvolvimento

O professor Surajit Mazumdar, da Índia, chamou atenção para os limites da industrialização dentro das regras do capitalismo global. Embora possa significar avanços importantes, ela também expõe contradições profundas do sistema, aprofundando desigualdades. Para Mazumdar, a construção de alternativas passa pela integração entre os países do Sul, com base na solidariedade e na soberania.

A experiência chinesa, trazida por Lyu Xinyu, mostra um outro caminho. A China tem investido na modernização da sua base produtiva por meio do alinhamento entre áreas urbanas e rurais, num esforço estratégico conduzido pelo Partido Comunista. Trata-se de uma industrialização planejada, com foco na gestão e na administração do território, visando a soberania nacional.

Já Josefina Morales, do México, trouxe um alerta importante: as indústrias de maquiladoras – fábricas montadas em zonas de livre comércio, voltadas à exportação – tem gerado precarização do trabalho e mantido o país nas pontas menos vantajosas das cadeias globais de valor. Um modelo que reproduz dependência e fragilidade, ao invés de fortalecer um projeto nacional de desenvolvimento.

A discussão desta manhã dialoga diretamente com os dilemas colocados no debate de ontem: não basta falar em transformação ecológica ou transição digital sem enfrentar a forma como o sistema organiza a produção, o trabalho e a vida. Industrializar sim – mas com soberania, trabalho decente e justiça social. Esse é o desafio histórico que se coloca para o Sul Global: retomar o desenvolvimento em novos moldes, enfrentando os legados do colonialismo e as contradições do capitalismo atual.

Share this content: