Cassações como retaliação: perseguições políticas visam silenciamento de vozes combativas da esquerda no legislativo
Editorial | Cassações de Bruna Biondi e Glauber Braga escancaram ofensiva da direita e do Centrão contra mandatos combativos, num cenário que ameaça a liberdade de expressão e antecipa novas perseguições políticas no país.
Nas últimas semanas, dois parlamentares do PSOL — a vereadora Bruna Biondi (São Caetano do Sul/SP) e o deputado federal Glauber Braga (RJ) — se tornaram alvos de processos de cassação que, mais do que simples disputas regimentais, revelam uma tentativa orquestrada de silenciamento político. Com atuações firmes de oposição e críticas diretas a esquemas de poder, ambos têm sido alvos de uma ofensiva que ameaça a liberdade de expressão e o papel da oposição nos legislativos.
Bruna Biondi enfrentou um processo de cassação na Câmara Municipal de São Caetano do Sul. A acusação partiu de vereadores da base do governo municipal, após a vereadora se posicionar de forma crítica em plenário. A tentativa foi derrotada graças à mobilização popular: manifestações de rua, manifestações de apoio nas redes sociais e articulação com movimentos sociais fizeram com que o pedido fosse retirado na última semana. A vitória evidenciou que ainda é possível barrar retrocessos com organização e pressão pública.
No Congresso Nacional, o caso de Glauber Braga escancarou ainda mais o caráter político dessas perseguições. No dia 9 de abril, o Conselho de Ética aprovou o parecer que pede sua cassação por 13 votos a 5, num processo marcado por arbitrariedades. O relator, deputado Paulo Magalhães (PSD/BA), não apresentou justificativa plausível nem respondeu aos questionamentos apresentados. O pedido teve apoio da maioria de direita do Conselho, num contexto de clara retaliação à postura combativa de Glauber, conhecido por denunciar o esquema do orçamento secreto e os interesses do Centrão.
A decisão segue agora para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, em seguida, pode ir ao plenário da Câmara. Em protesto, Glauber iniciou uma greve de fome que durou nove dias, ingerindo apenas líquidos. A ação, que mobilizou solidariedade de parlamentares, artistas e movimentos sociais, teve impacto na opinião pública e levou o presidente da Câmara a negociar a suspensão temporária do processo por 60 dias, enquanto a defesa do deputado é reforçada.
É evidente que o processo de Glauber não é técnico — é uma perseguição política direta promovida pela base do Centrão, que tenta silenciar uma das vozes mais combativas contra a corrupção e os conchavos parlamentares. A cassação, enquanto “punição” assimétrica em nome do decoro, serve de exemplo para intimidação de outros mandatos de esquerda em todo o país. E o contraste salta aos olhos: enquanto o processo contra Glauber avança rapidamente, o deputado Chiquinho Brazão — acusado de ser um dos mandantes do assassinato de Marielle Franco — segue com seu processo de cassação parado há mais de 200 dias.
A perseguição a Bruna Biondi e Glauber Braga não é isolada. Em diversas câmaras e assembleias legislativas, parlamentares de esquerda vêm sendo atacados por sua atuação. A deputada estadual Marina do MST (PT-RJ), por exemplo, sofreu tentativas de cerceamento e foi impedida judicialmente de participar de manifestações em sua própria defesa. Parlamentares que denunciam o genocídio contra o povo palestino também têm sido alvo de intimidação e ameaças.
Ao mirar mandatos identificados com movimentos sociais, causas populares e oposição ao autoritarismo, esses processos enfraquecem a democracia. Não se trata apenas de disputas regimentais — é a tentativa de impor uma hegemonia silenciosa no debate público, onde só cabe a voz dos que estão com o poder. É por isso que defender esses mandatos é defender também o direito à divergência, à crítica e à construção de alternativas dentro das instituições.
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